Assim como muitos outros meios de comunicação, o surgimento da internet se deu pelas vias militares, especificamente, nos períodos da Guerra Fria, na década de 60. Era uma forma de manter a comunicação das bases militares dos Estados Unidos, mesmo que o Pentágono fosse destruído pelas forças inimigas. A utilidade da rede era tanta que ultrapassou as fronteiras militares, chegando às mãos de cientistas e, posteriormente, às universidades. Hoje esse meio é acessível a qualquer utilizador doméstico, desde crianças, a pessoas com idade mais avançada, ainda que não tenham muitas noções de informática.
Existem diversas questões a serem discutidas acerca da popularização da internet, porém há uma que me chamou a atenção, que é o fato do crescente número de utilizadores da Melhor Idade. O envelhecer assusta, mesmo porque não é tradição valorizar e/ou respeitar as pessoas com mais idade. Hoje, muitas dessas pessoas, principalmente as mulheres, têm a internet como companhia, o que as fazem esquecer, mesmo por alguns instantes, a ausência de carinho e atenção por parte dos filhos, netos e familiares, e até a própria situação de abandono em que se encontram. Hoje é comum encontrá-las em fóruns, sites de relacionamentos, blogs, orkut, comunidades virtuais; inclusive, na Espanha, o prêmio de melhor blog em língua espanhola foi atribuído a uma senhora de 95 anos chamada María Amelia. Essa é uma prova de que temos muito que aprender com essas pessoas, pouco valorizadas, mas que têm muita bagagem pelas costas, e muitas experiências para compartilhar com as novas gerações.
Não sei se por influência desse público internauta, mas tenho notado atualmente o grande interesse por parte dos jovens por atividades artesanais que até então estavam um pouco perdidas no tempo como: pinturas, bordados, tapeçaria, entre outras. Pelo menos no que se refere a minha geração, não era muito comum encontrar moças prendadas, que soubessem os segredos das artes manuais. De certa forma, há um resgate de determinadas tradições e, se é verdade que essas mulheres virtuais não foram as responsáveis pela recuperação dessas tradições, não deixa de ser verdade que elas têm contribuído para o seu enriquecimento, a notar-se pelo grande número de comunidades destinadas a troca de experiências, informações, dicas, e até revistas inteiras de artesanatos, o que tem preocupado muitos editores que, equivocadamente, atribuem a elas a quebra de direitos autorais, mas por outro lado, não lhes confere a crescente popularidade do artesanato e, consequentemente, o aumento das vendas.
A verdade é que essa geração de mulheres virtuais já não passa despercebida, mesmo com olhos de reprovação. É no mundo virtual que elas conseguem interagir com pessoas de todas as idades, que conseguem se sentir importantes por terem a oportunidade de transmitir suas experiências, dicas, e até revelar suas dores e desejos mais profundos a uma amiga virtual, que talvez nunca cheguem a conhecê-la pessoalmente, mas que valoriza as suas potencialidades, seu ritmo e a importância dada a cada passo. O diabo seja cego, surdo e mudo, mas se os filhos descobrem que as mães podem viver sem eles...
sexta-feira, 14 de dezembro de 2007
Senhoras Virtuais
Publicada por Sandra Castro à(s) 04:14 5 comentários
sábado, 8 de dezembro de 2007
Feminismo x "Amelismo"
De fato, as mulheres conseguiram diversos avanços na sociedade ocidental, passaram a exercer o direito ao voto, realizar trabalhos tipicamente masculinos, proteção na gestação, entre outros, mas a discriminação ainda se mantém, principalmente quando se trata de salário. Hoje é possível encontrar mulheres em diversos setores da economia, mas os cargos de maiores prestígios (e também mais bem remunerados) ainda continuam sendo exercidos quase que exclusivamente pelos homens. Muitas precisam enriquecer o currículo com cursos universitários, mestrados, doutorados, idiomas para poderem provar que são tão competentes quanto os homens, acrescido ao fato de uma grande maioria possuir jornada dupla de trabalho, ou seja, além de ter de acordar cedo, pegar engarrafamento, também ficam responsáveis por todas as tarefas domésticas, lavar, passar, cozinhar, limpar a casa, cuidar dos filhos, e ainda tem de arranjar um tempinho para cuidar do visual, unhas, cabelos, pele, corpo, afinal a boa aparência também conta ponto, tanto para o trabalho, como para o marido. As mulheres de hoje estão sentindo na pele as consequências das feministas do passado, embora não haja nenhum documento, contrato pré-nupcial ou acordo que reserve à mulher todas as atividades domésticas, por conveniência machista, é sempre ela, a eterna Amélia, quem as fará, a menos que se possa ter uma secretária do lar.
Hoje em dia já se ouve falar em homem Beta, que é o oposto do homem Alfa. Trocando em miúdos, o homem Alfa é o chamado machista, trabalha o dia inteiro, chega em casa cansado, toma uma cerveja, deita-se no sofá, e é a pobre da Amélia quem traz isso e aquilo para ele, só falta colocar papinha na boquinha. Já o homem Beta, mais moderno, consciente, também colabora na lida, leva os filhos à escola, limpa os vidros, arrisca a fazer o almoço no final de semana, lava a louça, entre outras coisas, alguns são até metrossexuais, mas Jamais devem ser confundidos com BICHA, são apenas mais sensíveis. Mas as mulheres não se animem, eles existem, mas é uma espécie rara, muitos dos quais são solteirões, separados e que aprenderam a se virar sozinhos por conta da necessidade.
Não demora a surgir um outro movimento, oposto ao feminismo, até me arrisco a chamá-lo de "Amelismo". Adeptas já existem e muitas, inclusive nos países desenvolvidos. Já se alegam que os filhos criados com babás, avós ou pessoas que não sejam as próprias mães têm sua saúde mental e comportamental comprometida. Será que vamos voltar ao tempo das nossas avós? Perfeitas amélias (rainhas do lar), prendadas, boas de forno e fogão, mãos de ouro, trocar receitas de bolo com as vizinhas, e ainda arranjar um tempinho livre para ler dos livros do marido. Será que é isso que queremos?
Publicada por Sandra Castro à(s) 16:50 7 comentários
quinta-feira, 6 de dezembro de 2007
O prazer e a aflição de ser balzaquiana
Há algum tempo atrás, nas aulas de Literatura Francesa, fui apresentada ao grande escritor francês do século XIX Honoré de Balzac, autor do livro " A mulher de 30 anos", sua obra mais famosa, porém a mais fraca em termos de desenvolvimento narrativo, com personagens frágeis, e personalidades contraditórias, bastante distante da sua essência de escritor. Foi por conta dessa obra que surgiu a expressão "mulheres balzaquianas", embora poucos saibam da sua procedência.
Foi em "Mulheres de 30 anos", que pela primeira vez a mulher madura teve destaque na literatura. O autor valorizava sua beleza, experiências, pensamentos, desejos, angústias, reivindicava o direito dela ser feliz, e discutia as mazelas de um casamento fracassado, no qual a mulher estava destinada a carregar a cruz das suas obrigações sociais e legais, era prisioneira de seus deveres. Isso fez com que sua obra fosse motivo de escândalo, devido as convenções sociais da época, mas por outro lado, também conseguiu conquistar a comoção do público.
Antes de ler "A mulher de 30 anos", assim como muitos, também não conhecia a origem do termo balzaquiano, mas tinha muito receio de quando chegasse a ser uma, devido ao tom pejorativo que impregnava a palavra. Em outros tempos, ser balzaquiana significava ser solteirona, ou então casada, não mais dona de si, rainha e escrava do lar. Contudo, a expressão hoje parece ter adquirido outra conotação, pois uma mulher de 30 anos, pelo menos em algumas sociedades, já são mais independentes, casam-se tarde tarde, por opção, separam-se quando o casamento não vai bem, transam quando têm vontade, não só por amor, saem sozinhas sem se preocupar com a censura da vizinhança, são mães solteiras, e reconhecem que ainda são jovens, e com isso também podem ser atraentes. Como diz o escritor, "uma mulher de trinta anos tem atrativos irresistíveis para um rapaz... A mulher de trinta anos pode se fazer jovem, desempenhar todos os papéis, ser pudica e até embelezar-se com a desgraça".
Para muitas mulheres, assim como eu, custa aceitar a idéia de que já são balzaquianas, principalmente para nós brasileiras, conhecidas pela vaidade. Continuamos a vestir calças jeans, usar cabelos compridos, biquinis em lugar de maiôs, bermudas, tudo que possa nos deixar mais jovens, mas sem os exageros da adolescência. Evitamos roupas que nos deixam muito senhoras, calças sociais, blazers, até aventais, mesmo dentro de casa, nos informamos sobre os últimos lançamentos em termos de cosméticos e cirurgias plásticas para quando as marcas do tempo começarem a denunciar a nossa idade. Tudo isso pode parecer futilidade, mas sem dúvida é uma forma de elevar a auto-estima feminina, visto que tudo parece girar em torno dela, seja felicidade pessoal, o sucesso profissional, os relacionamentos amorosos, os projetos de vida, a criatividade, e até a vida sexual.
Como nem tudo é um mar de rosas, a partir dos 35 anos começaremos a sentir o lado menos agradável da mulher balzaquiana: diminuição dos hormônios, mudança de pele, quedas de cabelo, dificuldade em conceber um filho, a perda do frescor da juventude. Mas que importa, se ainda temos a Melhor Idade nos esperando mais a frente?
Publicada por Sandra Castro à(s) 01:40 24 comentários